quinta-feira, 3 de setembro de 2009

Sobre a Saudade

Comecei a contar os fiapinhos de tecido vermelho enganchados na minha roupa. Nossa, como é a saudade, que faz com que até sua vestimenta queira permanecer bem juntinho, sem largar a pessoa querida. Gentilmente separei-os de mim e guardei-os no bolso. Todos sabem o quanto é indelicado jogar fora os fiapinhos de quem se gosta.
Após esta divertida tarefa, minha atenção virou-se para meu ambiente. Uma composição móvel, viajando em linha reta e curva, mas sempre seguindo um trajeto bem definido e já viajado milhares de vezes. Lá fora, viam-se as paisagens modificando-se com o tempo. Um Sol, uma nuvem, o Sol novamente. Verde, Cinza, Verde novamente, Cinza enfim. Pessoas passavam correndo antes que eu pudesse identificar-lhes o semblante, então resolvi olhar para mais perto, para dentro.
Uma moça lia calmamente seu livro, não identificado, pois ela, cuidadosa como era, encapava-os tal qual na sua infância encapava a carteira da escola, após limpá-la com álcool. Sua expressão pouco mudava, mas recordava-me o jeito lindo com que ela me olhava, não ela-moça do livro, mas ela-moça dos fiapinhos vermelhos, que acabara de deixar.
Uma risada de criança fez-me virar o rosto, procurando pelo infante feliz que soltara-a. Minha procura terminou, quando vi um lindo bebê em pé, no colo de seu pai, que orgulhoso de seu lindo menino, fazia caretas que deixava-o risonho. Suas risadas garantiram sorrisos de metade do vagão e é sempre assim quando o assunto é criança. Todos os adultos deixam seus problemas de lado e suas caras sérias, para fazer graça e relembrar momentos. Desde que comecei a pensar em sorrisos, sei que reservo os de maior qualidade para as crianças e não me lembrava de ter sorrido fácil assim para adultos. Ela é a primeira.
Meu caminho torna-se cada vez mais curto e inversamente proporcional, a vontade de tê-la aumenta. Talvez seja uma das únicas vezes em que sinto a distância real das coisas, pois meço-as de acordo com algo que conheço muito bem, o sentimento de saudade.
Sentei-me cansado, pois finalmente o vagão encontrava-se mais vazio. Meu maior problema em sentar cansado é que meus olhos entendem que também devem descansar e acabam por fechar rapidamente. Rapidamente é um modo de dizer, pois nunca sei quando durmo e adentro o ambiente gostoso do sonhar. Ela fazia-me afagos no cabelo, enquanto descansava sobre seu corpo. Seria uma lembrança? Ou seria realmente Sonho? Sua pele macia fazia-me bem aos lábios e sua boca conhecia meu pescoço inteiro. Dançavamos sem parar e tomávamos sorvete na lua. Beijávamos e abraçávamos em sintonia e sincronia. Havia cumplicidade em realizar todas as delícias da vida e era uma cumplicidade nova, algo novo.
Acordei assustado para descer na estação, mas não sem antes suspirar seu nome...

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